No que a vida se torna...





A infância é, por excelência, um percurso de aprendizagens, do novo, em que adquirimos as ferramentas necessárias pra crescer, por assim dizer, o kit de sobrevivência. Á medida que crescemos e trocamos impressões com amigos e família, que tomamos contacto com o mundo real dos outros, damos conta (ou não?) que nem todas são infâncias sãs. Porque o mundo está terrivelmente doente, e todos os remédios da cura que se encontram ao nosso dispôr são colocados á distância considerável do amanhã, que pode nem lá chegar.
As crianças aprendem connosco, moldam-se por imitação e depois, por conta própria, a vida os encarrega de moldar, dependendo dos caminhos trilhados, das escolhas ao longo deles, do ambiente que os rodeia. Que o homem não se faz a si mesmo, já sabemos. Somos uma multidiversidade de biologia e antropologia, sociologia, filosofia, psicologia e tantas coisas mais. Enquanto responsáveis pela educação, pelos laços afectivos e pelo desenvolvimento geral dos menores, devemos cuidar sem desmazelo, desta imensidão de dados e conhecimentos que nos são facultados, através da experiência-erro-aprendizagem. Existe uma imensa bibliografia sobre esta matéria e outras, sobre o que fazer com crianças sem infância. Deparo-me com casos (bem sei que grave é a fome e a sede sem saciação, seja de alimentos ou de afectos) gravíssimos de negligência por narcizismo, pais focados em si, centrados no seu bem estar. E é nessa era que estamos. Saciar os bens de consumo dos miudos pra atenuar a falta de tempo pra eles.
Do livro Ajudar as crianças a ultrapassar as perdas, de Brenda Mallon, extraio o seguinte:
As crianças aprendem o que vivem
Se uma criança viver com criticismo, aprende a condenar.
Se uma criança viver com hostilidade, aprende a combater.
Se uma criança viver com zombaria, aprende a ser tímida.
Se uma criança viver com vergonha, aprende a sentir culpa.
Se uma criança viver com tolerância, aprende a ser paciente.
Se uma criança viver com louvores, aprende a apreciar.
Se uma criança viver com encorajamento, aprende a confiança.
Se uma criança viver com equidade, aprende a justiça.
Se uma criança viver com segurança, aprende a ter fé.
Se uma criança viver com aprovação, aprende a gostar de si mesma.
Se uma criança viver com aceitação e amizade, aprende a encontrar amor no mundo.
A perda da infância
Quando os adultos pensam em "perda", estão, geralmente, a pensar em acontecimentos críticos da vida, como a morte ou o divórcio; porém, quando se pede ás crianças que falem das suas perdas, a extensão das suas associações é frequentemente surpreendente. As crianças falam da dor de perderem o melhor amigo, por causa de uma discussão, de parecerem tontas diante dos seus pares, de deixarem de ter a atenção dos pais depois do nascimento de um irmão mais novo ou de sentirem que perderam alguém muito importante, quando a mascote da escola morre. Na nossa "superioridade" de adultos, as mais das vezes não damos importância a estes acontecimentos ou consideramos que são atribulações menores. A nossa linguagem corporal passa a mensagem:" Ah, isso não é uma verdadeira perda, eu conheço bem as "verdadeiras perdas", como se tivessemos um conhecimento interiorde uma tabela das perdas que uma criança não pode conhecer! Mas perda é perda. O que a criança sente é a verdade real e é isto que temos de ter sempre presente, quando trabalhamos com elas.
O sofrimento da perda na infância é uma dor crua e penetrante que pode ser devastadora. Os adultos têm o benefício da experiência e do conhecimento passados, podem perspectivar a perda, mas não é esse o caso das crianças. Enquanto nós podemos ter descoberto maneiras de nos reconciliarmos com a dor - tendo descoberto estratégias para a ultrapassar, visto como outros o conseguiram ou acreditam que a dor irá passar, tal como aconteceu no passado - as crianças não possuem este reconfortante conhecimento, por muito ínfimo que possa ser. Demasiado frequentemente, nós, "as pessoas maduras", tornamo-nos insensíveis ao sofrimento que pode ocorrer na primeira fase da vida e ignoramos as profundas emoções que a perda provoca na infância.
Perder a oportunidade de olhar e ver, ouvir e perceber, de ser tocado e sentir é o mesmo que acomodar o estômago á fome, sem procura de alimento. Porque há silêncios que são gritos e não ousam espaço! Fica um alerta vermelho!



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