Espírito de Missão

 






As vicissitudes acumularam-se.

Fora assim a vida toda. Zero de ambição.

O resumo ou síntese que cabia aqui era: Afinal, a conduta tinha sido sempre a mesma. Amor, a tudo, flores, cores e música, teatro, expressão e magia, e sobretudo a pessoas. As pessoas não retribuíam porque não entendiam a dádiva. Os animais sim. Ela era como eles, recíprocos. Os de quatro patas. As aves. Todos os outros, de alguma forma, teimavam em pendurar tabuletas ou virar as costas. Não admirava que lhe chamassem extraterrestre. 

Ela era um. Mas só agora avaliava as coisas por esse prisma. Ela dava a camisola, o tempo, o amor, as receitas, sem olhar a quem. Não esperava nada em troca e, nem bem tinha caído no sono e já era bombeira outra vez, ou dos mesmos ou de outros. Sempre sem medir esforços, numa entrega que nem mesmo vira em pessoas próximas. Nem nas missões cristãs, pois as missionárias, ainda que imbuídas do espírito cristão, recebiam a refeição, o apreço ou o reconhecimento. Ela nada. E tantas vezes, a traição. Tantas traições se avolumaram! Raras vezes a ouvi queixar-se. Lamentar-se. Chorar. Voltava a fazer o mesmo, uma e outra vez. Por esse motivo, chegara ao quadro final. Ao espelho: 

-Diz-me quem sou, espelho meu?

- Não queria revelar-te assim, de mão beijada, mas se não for eu, será outro espelho a dizer-to. Tu és uma serva de Cristo. Bem próxima dele. E trazes uma grande responsabilidade entre mãos. Suprir através do amor d'Ele a fome de fé, a fome de alimento, a fome de saúde. E ser um exemplo. Imitar a Cristo. Só não te prejudiques mais! Aprende que o amor, mesmo o mais pequenino, necessita de reciprocidade. Como podes tu desempenhar o que te foi confiado se não estiveres bem?

O espelho era baço, nem sequer antigo, mas possuía alguma sabedoria. Só um espelho atento lhe responderia, nomeando Cristo. Ela conhecia bem Cristo. 

A prova ou teste que Cristo lhe preparara iria atestar do seu amor virtuoso. 

Ela não tinha receio do exame. A vida toda lhe provava que tinha vindo com essa missão.  Ela só não aguentava o peso da cruz que trazia, na mesma posição, há mais de dois anos, sem ter uma data que pudesse colmatar a ansiedade. Dar-lhe um rumo. Para poder rasgar o caminho depois. A família chegada estava toda doente e ela própria, o sono era raro fazer aparição e o fio condutor de tantas maldades na sua vida estava do lado avesso da sua entrega. Ela culpava-se por a família ser submetida áquilo. E alguns confundiam os seus filhos, desejando-lhes mal, abusando da sua bondade. Como o faziam com ela. Os seus filhos eram o espelho dela. De um coração meigo e tolerante. Ela sabia ser o extremo dessa entrega. Os frutos do seu ventre lhe diziam repetidamente: Tens que deixar de ser assim. Para. Observa. Onde estiveram esses amigos vida fora, quando precisaste? Eles sabiam o mesmo que ela. As pessoas não eram merecedoras dessa entrega.

"Depois do sacrifício final virá a tua REDENÇÃO: em breve. E serás os meus olhos e a minha espada. Não receies"

E a minha fé, de um pequeno grão de mostarda, se agigantou, era uma cidade de luzes, onde o Seu amor brilhava. Não tinha medo de nada. Se Ele era por ela, quem contra ela?

Medo nenhum. Apenas cansaço. E não tinha solidão, apenas sede de saber, sede de entrega do tesouro que tinha dentro. Precioso e raro. Ela não era uma mulher, era uma ponte que mediava dois mundos. E as águas eram-lhe essenciais. 

O seu mago também. Os seus ancestrais apareciam uma e outra vez, já nem escolhiam a noite para o fazer. E garantiam-lhe que o seu sacrifício lhe traria a realização de um sonho antigo. E essa era a sua recompensa maior, cumprir a missão a dois. 



"Eis que venho em breve! A minha recompensa está comigo, e eu retribuirei a cada um de acordo com o que fez. Eu sou o Alfa e o Ômega, o Primeiro e o Último, o Princípio e o Fim.

Apocalipse 22:12-13

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